Análise: Igreja Popular, Dom Boaventura Kloppenburg
Análise: Igreja Popular
Dom Boaventura Kloppenburg – OFM
A década de 70 é fundamental para a compreender formalização do movimento libertário. A tentativa de utilizar as Conferências de Medellín (1968) e Puebla (1979) como símbolos de legitimação foi uma das principais táticas para que as ideias libertárias fossem aceitas dentro da instituição. É neste contexto que se insere o valor ímpar da obra de Dom Boaventura Kloppenburg.
Enquanto Reitor do Instituto Pastoral do CELAM, Boaventura sentiu de perto o desconforto que assolou a cúpula dos bispos da América Latina no período pós-Medellín. Havia um sentimento mais ou menos geral – notem: muito antes do testemunho de Mihai Pacepa – de que a Conferência estava sendo usada para finalidades externas às da Igreja. Após a eleição de Dom Trujillo, em 1972, como secretário geral do CELAM, os bispos se ocuparam em tentar compreender mais claramente o que estava ocorrendo. No fio desta investigação o CELAM se deparou com um movimento chamado de Cristão pelo Socialismo (CpS) cujo principal projeto em andamento seria a construção do que eles denominavam então de Igreja Popular.
“No começo de 1976 alguns Bispos do Peru me falaram da urgente necessidade de investigar com mais atenção o aparecimento de um movimento teológico-pastoral latino-americano que naqueles anos começava a chamar-se “Igreja Popular”. Era eu então Reitor do Instituto Pastoral do CELAM (…). No final de 1976, a XVI Assembleia Geral do CELAM, reunida em Porto Rico, pedia em sua primeira Recomendação ‘um estudo da assim chamada Igreja Popular e de outras manifestações desta modalidade teológico-ideológica’. Como eu já tinha o material devidamente estudado e classificado, redigi em janeiro de 1977 um ‘Informe sobre a Igreja Popular’, que foi enviado às Conferências Episcopais da América Latina, em forma mimeografada”. (p. 9)
Ainda no mesmo ano, o texto do informe foi publicado como primeiro número da Coleção “Cadernos de Teologia Pastoral”, pelas Edições Paulinas de Bogotá. Três anos após Puebla, devido a tentativa de cooptar agora a imagem da nova conferência como símbolo das pautas ideológicas do grupo, foi necessário acrescentar ao texto original uma quarta parte dedicada ao estudo das deturpações da Igreja Popular em Puebla e, em seguida, ainda uma quinta parte sobre o conceito de opção preferencial pelos pobres.
É digno de nota a ampla documentação de fonte primária que serve de base para o estudo. O texto de Dom Kloppenburg trabalha com uma série de documentos originais dos próprios congressos socialistas, merecendo destaque sobretudo o Primeiro Encontro Latino-americano dos Cristãos pelo Socialismo (1972 – Santiago/Chile) e o Primeiro Encontro Internacional (1975 – Québec/Canadá).
O Informe e seus adendos são peças de fundamental importância para a compreensão do contexto eclesial da década de 70. É sintomático que esse material tenha sido amplamente ignorado no Brasil. Sem a clareza em relação ao contexto delineado neste livro torna-se impossível compreender adequadamente as deformações ideológicas que até hoje promovem uma hermenêutica distorcida e enviesada a respeito das Conferências Episcopais de Medellín e Puebla.